Argumentos
e Falácias
(fonte:
Dicionário Aurélio) |
Argumento
ad hominem.
1. Argumento
com que se
procura confundir o adversário, opondo-lhe seus próprios
atos
ou palavras.
Argumento
ad judicium.
1. Argumento fundamentado
na opinião corrente ou
no senso comum.
Argumento ad populum.
1. Sofisma em que se
associam
ao objeto da argumentação
elementos que tocam à sensibilidade, às necessidades,
às aspirações, aos temores, etc., do público
que se quer convencer.
Argumento ad rem.
1. Argumento relativo ao assunto em foco.
Argumento baculino (ad baculum).
1. Argumento que consiste em pretender provar a existência
do mundo exterior golpeando o solo, ou mesmo aquele com quem
se argumenta, com um bastão.
2. P. ext. Demonstração ou refutação
de uma tese filosófica por meio de uma ação
material, como, p. ex., mover-se, para provar, aos que negam
a possibilidade do movimento, que este existe.
3. Imposição de uma tese com base no medo ou na
timidez do adversário em face da superioridade física
de quem argumenta.
Argumento da autoridade
1. V. apelo ao respeito.
Levar um argumento. Bras. Gír.
1. Ter diálogo; manter conversação; tratar
um assunto.
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Esclarecimentos
sobre a Pesquisa de Michel Gauquelin |
Debate travado entre o astrólogo
Maurício Bernis e o jornalista Ricardo Bonalume na Revista
da Folha de São Paulo
Maurício Bernis
Pelo fato de estudar Cosmologia, Antropologia e Filosofia e me deparar inevitavelmente
com o tema astrológico, tornando-se também um
tema de meus estudos, recebi várias ligações
telefônicas esta semana, todas motivadas pela mesma dúvida:
quem foi, afinal, Michel Gauquelin? A sua pesquisa, afinal,
confirmou ou desmentiu o corpo de afirmações astrológicas?
Diante desta situação (e relendo novamente todos
os textos que foram trocados entre os dois profissionais na
Revista da Folha de número 505 e 507 no mês de
fevereiro de 2002), percebi que em ambos não se esclarecia
devidamente em que consistiu a pesquisa de Michel Gauquelin
e, principalmente, quais foram as deduções que
o meio acadêmico e astrológico tiraram dos resultados
obtidos; deduções, estas, que se tornaram responsáveis
por toda uma série de mal entendidos que se seguiram
aos resultados da sua pesquisa e que, pelo o que vemos, permanece
até hoje. O artigo que aqui escrevo visa a repor esta
lacuna de modo que todos possam compreender porque a pesquisa
ora parece confirmar a existência do fenômeno astrológico
e, ora, parece desmenti-lo.
Vamos lá: o que podemos dizer sobre a vida de Michel
Gauquelin de modo que possamos compreender os fatores que o
levaram a desenvolver a pesquisa a que deu o nome de Cosmopsicologia?
Que desde criança já manifestava interesse pela
astrologia de cunho popular, que ficou ciente da importância
da prova científica sobre o fenômeno astrológico
quando passou a estudar psicologia e estatística na Sorbonne,
e que foi o profissional contratado pelo observatório
de Paris para comprovar que o fenômeno astrológico
não existia.
A princípio, Gauquelin se debruçou sobre as afirmativas
e os resultados obtidos por outros astrólogos (Krafft,
Choisnard e outros) e, para o seu dissabor, descobriu que os
métodos destes pesquisadores tinham erros e que suas
descobertas eram inválidas. Após muitos anos de
esforço, descobriu que todas as afirmativas científicas
feitas a favor da astrologia eram falsas, e que nem um único
elemento da tradição astrológica resistia
à avaliação estatística. Em suas
próprias palavras, foi como ser traído pela amada.
Tendo se desfeito de todas as afirmações contidas
na astrologia de cunho popular, ou seja, da validade dos signos
solares, ascendentes e etc na composição do diagnóstico
de uma personalidade, restava-lhe somente verificar a existência
do fenômeno através de qualquer outra hipótese
astrológica e, daí, resolveu analisar as duas
hipóteses mais tradicionais existentes na doutrina astrológica:
a herança familiar e a vocação profissional,
sendo esta última aquela que o ocupou praticamente dos
anos 50 aos 80 e diante da qual descobriu, com espanto renovado,
que o nível estatístico encontrado ultrapassava
em muito a margem do meramente casual.
Mas o que significa a hipótese da vocação
profissional dentro da astrologia? Significa, em linhas gerais,
que haveria certas configurações celestes que
determinariam o temperamento do indivíduo e que este,
por ter determinado temperamento, procuraria normalmente uma
determinada profissão e não outra: os indivíduos
mais introspectivos procurariam a área das letras, os
mais reflexivos procurariam as áreas científicas,
os mais expansivos procurariam a área política
ou artística e os mais enérgicos procurariam a
área militar ou esportiva e assim por diante. Para Gauquelin,
teria de ser encontrado um padrão que comprovasse a relação
existente entre astros e profissão, muito embora esta
relação não fosse direta pois ela se encontrava
intermediada pelo temperamento humano. O que, para ele, não
consistia num problema mas, sim, no início de uma possível
solução: afinal, aqueles que conseguem se destacar
em determinada profissão são aqueles que possuem
as características mais adequadas a determinado exercício
profissional, de modo que tal atividade se torna o prolongamento
e a manifestação mais natural de determinado temperamento
humano.
Para realizar tal empreendimento junto com a sua esposa, Gauquelin
procurou disponibilizar de quase 15 mil mapas de notáveis
profissionais e mais outros 12 mil de outros profissionais que
não foram tão notáveis assim em sua carreira.
Estudou-se 10 categorias profissionais de indivíduos
que nasceram entre os anos de 1794 a 1945, certificando-se de
que todos os fatores demográficos, astronômicos
e sociais que estavam sendo levados em conta garantissem a menor
margem de dúvida com relação a validade
dos dados coletados, tornando este trabalho o mais severo e
rigoroso já empreendido na área de astrologia
neste último século. Todo este imenso trabalho
foi realizado manualmente, sem o auxílio de um recurso
de que dispomos atualmente: a informática. Mesmo assim,
os resultados obtidos permanecem altamente significativos, apesar
das inúmeras retificações e avaliações
que foram feitas posteriormente por outros cientistas e pesquisadores.
Não será possível, neste curto artigo,
expor todos os pormenores desta pesquisa (1), muito embora seja
necessário mencionar as linhas gerais em que ela se desenvolveu
e as descobertas realizadas. Por isso, o que devemos saber é
que, ao calcular todos esses mapas que tinham em comum o grupo
profissional a que pertenciam, descobriu-se que havia um padrão
que se repetia em todo e qualquer caso, e que o índice
era tão relevante e a repetição tão
constante que o acaso não poderia estar em jogo para
explicar o fenômeno.
Esse padrão foi conhecido inicialmente pelo nome de efeito
Marte, e isto porque era ele quem revelava a existência
de um fator que aparecia repetidamente no mapa de militares
e esportistas expoentes: a presença do planeta marte
ou no horizonte do observador, ou no zênite, ou no poente
ou no nadir astronômicos, que correspondem respectivamente
aos ângulos cardinais de maior significância em
um mapa astrológico, a saber, o ascendente, o meio-do-céu,
o descendente e o fundo-do-céu. A medida que a pesquisa
foi avançando, descobriu-se que o mesmo padrão
se repetia nos outros grupos profissionais, muito embora o planeta
que entrava em jogo fosse outro:·
para o grupo dos políticos e atores, descobriu-se que
júpiter era o planeta que figurava numa destas quatro
posições astronômicas; para o grupo dos
filósofos e cientistas, descobriu-se a relevância
do planeta saturno; para o grupo dos literatos, a relevância
da lua. Estes padrões, altamente significativos do ponto
de vista estatístico, estavam ainda completamente de
acordo com a tradição astrológica que predica
ao temperamento humano uma certa dominância planetária,
a saber:
- que os indivíduos de temperamento expansivo e grandiloqüente
teriam júpiter em posição dominante no
mapa;
- que os indivíduos de temperamento reflexivo e detalhista
teriam saturno em posição dominante no mapa;
- que os indivíduos de temperamento intimista teriam
a lua em posição dominante no mapa;
- que os indivíduos de temperamento intrépido
e ousado teriam marte em posição dominante no
mapa.
Desse modo, a pesquisa de Gauquelin comprovou, sem que se
quisesse inicialmente, a hipótese da dominância
planetária, muito embora sua pesquisa não abarcasse
todos os planetas da tradição astrológica
- e isto porque, ao tentar considerar o sol, vênus e mercúrio,
não encontrou um padrão que fosse igualmente significativo
do ponto de vista estatístico. No entanto, como encontrava
severas resistências para que o seu trabalho fosse aceito
pela comunidade acadêmica européia, viu-se diante
da obrigação de rever todo a sua pesquisa e prová-la
sob outra perspectiva - o que tornou o seu empreendimento ainda
muito mais interessante e inteligente do que já era.
O que foi, então, que Gauquelin fez? Se a presença
altamente significativa de determinado planeta nos mapas dos
indivíduos de certos grupos profissionais não
era suficiente para provar e convencer a ninguém, e se
de fato a relevância do planeta marte no mapa de militares
e esportistas não servia para atestar nada, por mais
que na tradição astrológica se predicasse
que os indivíduos de temperamento ousado teriam marte
como um planeta dominante no mapa, o que lhe restava fazer?
Restava provar sua experiência ao contrário, ou
seja: se marte aparece de maneira dominante no mapa do grupo
dos militares e esportistas, e se marte de alguma maneira não
explicável está relacionada a um certo temperamento
combativo que certas pessoas têm, obviamente o índice
estatístico da posição da lua nestes mapas
deveria ser o inverso, isto é, baixíssimo, visto
que a lua estava associada ao temperamento inverso, isto é,
a pessoas de temperamento intimista e introspectivo, o que as
levava naturalmente a ocupar uma posição na área
das letras.
A partir deste raciocínio, Gauquelin inclusive considerou
a possibilidade de que mesmo no grupo dos militares poderia
haver algum profissional que fosse descrito como alguém
de personalidade mais intimista - e neste mapa, somente neste
mapa, a posição da lua deixaria de ocupar um posição
sem significado e passaria a ocupar uma posição
mais significativa, atestando que este indivíduo era
um indivíduo de personalidade mista, e que integrava
dois temperamentos distintos. Resultado: mesmo analisando os
resultados anteriormente obtidos em todo e qualquer grupo sob
esta perspectiva, o índice estatístico encontrado
só corroborava o resultado inicial. Ou seja: a sua pesquisa
novamente se reconfirmava.
No entanto, tal índice não se mostrava altamente
significativo quando se avaliava o mapa de profissionais que
não haviam se destacado pelo seu exercício profissional
- e isto se constituiu num ponto polêmico da sua pesquisa.
Afinal, porque este índice aparecia de maneira significativa
no mapa dos melhores profissionais e não no mapa dos
profissionais de atuação mediana? Talvez por uma
questão óbvia que tenha passado desapercebida:
somente na biografia das pessoas que lutaram para fazer a vida
de acordo com a própria natureza e vontade se veria a
marca expressa do seu temperamento, dado que em condições
normais ou adequadas este temperamento não se revelaria
de maneira tão expressiva e notória. Para Gauquelin,
"a profissão põe ainda em jogo comportamentos
humanos... Os que conseguem arranjar um nome em determinada
profissão manifestam mais nitidamente que os outros as
tendências fundamentais que se escondem sob a etiqueta
profissional (2) ".
No mais, como todo o seu esforço estava comprometido
em levantar provas estatísticas que atestassem a existência
destes padrões, se viu impossibilitado de levar a cabo
a continuidade da sua pesquisa e provar a relação
existente entre certa dominância planetária e o
temperamento do biografado, por mais que em suas tabelas anotasse
quantas vezes determinado adjetivo tinha sido predicado a um
indivíduo. Afinal, por entre os índices altamente
significativos das estatísticas, havia a confirmação
velada da dominância planetária, conservada inclusive
na linguagem corrente com que se adjetiva determinados atributos
psicológicos: um temperamento lunático, um passo
marcial, um semblante jovial e etc. Mas este trabalho, propriamente
astrológico e de natureza psicológica, não
foi e não pode ser realizado com o mesmo rigor. Talvez
seja por isso que Gauquelin fez questão de frisar que
"se bem que tenhamos obtido fatos positivos a partir de
um material de aparência astrológica na origem,
é evidente que esses resultados, por mais espantosos
que sejam, devem-se explicar em termos científicos e
não em termos astrológicos. Melhor: eles são
uma nova e poderosa crítica dessa superstição
(3) ".
Esta observação de Gauquelin é que o tornou
tão mal compreendido pela própria comunidade astrológica,
pois, para ela, o próprio pesquisador se recusava a admitir
a natureza do trabalho que realizava, muito embora ele soubesse
e reconhecesse que o seu trabalho se dava, sim, num contexto
de natureza astrológica. No entanto, Gauquelin reconhecia
também que a sua comprovação se dava através
de um método estatístico que se debruçava
sobre um fenômeno simultaneamente astronômico e
humano - e nada mais por enquanto.
Talvez ele tenha colocado a questão nestes termos por
uma questão estratégica, dado que a comunidade
científica da época estava pronta - e ainda está
- a combater drasticamente qualquer prova a favor da astrologia,
sem examiná-la com o mesmo rigor, dedicação
e paciência. Afinal, se Gauquelin insistisse em descrever
verbalmente a sua pesquisa como sendo de natureza astrológica,
desde já não seria sequer lido e moveria toda
e qualquer espécie de preconceito da comunidade acadêmica.
Porém, se colocasse a pesquisa nos termos exigidos pelos
moldes científicos, isto pelo menos a colocaria numa
condição de análise e leitura. Ou, pelo
menos, numa condição de maior respeitabilidade
visto que a atitude intelectual que os astrólogos assumiam
frente a própria disciplina era digna de pena e de descrédito.
Afinal, ele, melhor do que ninguém, condenava as pretensões
científicas dos seus colegas de classe que tentavam abordar
a astrologia através de uma metodologia completamente
inconsistente, além de terem desenvolvido também
uma resistência quase que neurótica em examinar
as evidências negativas da disciplina que praticavam.
Apesar do seu esforço metodológico e argumentativo,
a comunidade acadêmica jamais recebeu bem a sua obra.
Os dados de Gauquelin, juntamente com a saga que cerca estes
dados, constituem um dos mais importantes episódios acadêmicos
do século. A saga, contada em detalhes (4), revela -
talvez melhor do que qualquer outra história em particular
- a natureza verdadeiramente inquisitorial da Igreja científica
na busca pretensa do conhecimento e da verdade. Por isso, o
manifesto que foi movido em 1976 por 186 notáveis cientistas
contra a astrologia demonstra, tal como disse Paul Feyerabend,
uma ignorância dos mais recentes resultados em seus próprios
campos (astronomia, biologia e a conexão entre os dois),
bem como numa carência para perceber as implicações
dos resultados que conheciam. Mostra a dimensão de quanto
os cientistas estão prontos a afirmar sua autoridade,
até mesmo em áreas em que não possuem qualquer
conhecimento. Ao ser indagado se iria ou não assinar
tal manifesto pelos seus colegas cientistas, Carl Sagan disse
que se sentia incapaz de endossar o manifesto "Objeções
a Astrologia", não porque sentia que a astrologia
tinha o que quer que seja de validade - mas porque sentia que
o tom da afirmação era autoritário...
Por isso, o resultado da pesquisa de Michel Gauquelin teve uma
repercussão ambígua: apesar dele ter conseguido
demonstrar estatisticamente que há uma relação
considerável entre a dominância planetária
no mapa de indivíduos que se destacaram em determinada
profissão, obteve o desprezo e o rancor:
a) da comunidade astrológica porque a sua pesquisa se
limitou somente sobre uma única hipótese de toda
a doutrina e, ainda assim, sobre a dominância de 4 planetas
e não de todos os outros, tendo esta pesquisa sido descrita
de uma maneira onde se revelava uma preocupação
de não apresentá-la como uma pesquisa exclusivamente
astrológica;
b) da comunidade acadêmica que sequer queria conceber
a possibilidade de haver uma relação entre estrutura
astronômica e um evento humano, por mais que ela tivesse
sido provada e reanalisada por outros pesquisadores que não
chegavam a um resultado muito diferente do já obtido,
jamais abalando a estrutura da hipótese comprovada.
Aliás, muita pouca coisa foi invalidada. O que ainda
não foi comprovado (a menos ou até que se estabeleçam
testes que produzam resultados contrários) é a
capacidade dos astrólogos interpretarem científica
e quantitativamente o horóscopo - uma questão
totalmente diferente.
Mas isto já é assunto para um outro artigo a ser
realizado num futuro, que poderia explicar inclusive a pesquisa
feita pelo estudante de física da Universidade da Califórnia
Shawn Carlson que foi publicada na Revista Nature em 1985 -
outra pesquisa da qual surgiram deduções equivocadas.
De qualquer modo, é por isso que o debate em torno do
tema astrológico sempre se torna polêmico e confuso.
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