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A
Greve dos Signos
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Muito parecido com a discussão em torno de justificativas
e preconceitos, esse conto leva o leitor a perceber que
nem a parte nem o todo podem ser separados.
- Num
dado momento da Eternidade, os signos do Zodíaco se
reuniram perante o Ser Supremo. Sentados em torno de
sua távola de estrelas, reclamavam que, apesar de conferirem
ao Homem seus atributos (conforme o Ser assim havia
dito), a espécie, a máxima criação divina, não se harmonizava
e não estava conseguindo chegar ao ponto de relação
com a Fonte de Luz. Um signo acusava o outro de impedir
a harmonia e a felicidade humana. Cada um achava ser
o senhor da verdade e que a humanidade deveria agir
conforme seu padrão. A discussão aumentou até que o
Ser Supremo, com infinita sabedoria, sugeriu: "Façam
uma greve." Todos ficaram estupefatos. Silêncio
total na Eternidade. O Ser continuou: "Aqueles
cuja ausência puder ser equilibrada pelos outros serão
retirados do Zodíaco e passarão a fazer parte das outras
constelações. A greve será feita por um de cada vez,
de forma que todos vejam os efeitos. Para que a vida
no Universo não sofra as conseqüências, vamos fazer
isso no plano das idéias. Se vocês acharem que tudo
estará bem, faremos no plano físico logo em seguida".
- Todos
se aprumaram, prontos para começar nessa empreitada
do "o que aconteceria se
".
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- Áries
tomou a dianteira e declarou: "Sem mim, nada no
Universo poderá ser iniciado".
E
assim começou um período onde crianças permaneciam presas
no útero, nenhuma semente brotava e nem surgia nas plantas,
ninguém saía mais de suas casas, não havia mais nada
que interessasse na Terra, pois sem a energia e a iniciativa
de Áries a realidade se tornara estagnada, sem movimento
Além
disso, não era possível decidir coisa alguma, tal era
a dificuldade de optar por um caminho a seguir. Todos
esperavam a aprovação de todos, o que levava a mais
e mais estagnação. Ninguém conseguia sacrificar-se o
suficiente para reverter a situação, não havia mais
honestidade nem nobreza para enfrentar as vicissitudes.
A falta de energia era tão grande que os planetas pararam
de se movimentar. Na Terra, em um dos hemisférios só
havia dia e calor causticante. No outro só a noite e
o frio congelante. A locomotiva do Zodíaco parara.
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- Com
o mundo à beira da destruição devido à inatividade total,
os arquétipos se reuniram e decidiram afagar o ego do
Carneiro pedindo-lhe para retornar a seu posto. Orgulhoso,
ele atendeu o pedido.
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- "Que
Touro se apresente", disse o Ser em sua voz de
mil trovões.
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- Touro
então inicia sua greve. Logo tudo passa a cheirar mal,
a terra seca e as pessoas empobrecem. Miséria espalhada
por todo canto, colapso econômico, ganância e falta
de contenção de impulsos geraram ondas de violência
sem igual. A paz taurina havia sido banida. Todas as
coisas mudavam repentinamente e sem parar. Não se podia
mais esperar nada do futuro. As crianças nasciam e morriam
logo em seguida, devido à dificuldade de manter as coisas
por um certo período. Aliás, os organismos perdiam a
resistência tão rapidamente que qualquer alteração (e
haviam muitas), provocava uma catástrofe.
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- Os
arquétipos, convencidos do problema, pediram o retorno
de Touro, que recusou-se a fazê-lo. Depois de muitas
vezes e com muita insistência, os arquétipos se reuniram
e pediram o retorno de Touro, que, relutante, sentou-se
em seu lugar.
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- Chegou
a vez de Gêmeos. Todos sentiram o ar ficar rarefeito,
houve silêncio novamente, mas tal silêncio era involuntário
e sepulcral. Ninguém mais concatenava as idéias, nada
podia ser dito e quando era dito se tornava dogma, sem
lógica, sem flexibilidade, sem humor. As coisas se repetiam
infinitamente, pois nunca houve tanta falta de variedade
no Universo. Se alguma coisa era ensinada de um jeito,
ninguém mais podia ter outra opção. A falta de comunicação,
com as pessoas não querendo mais ouvir e muito menos
ponderar questões mesmo as simples, estava criando o
ambiente perfeito para a guerra, isso sem falar nos
problemas respiratórios e de sistema nervoso que afetaram
a todos.
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- Após
uma série de controvérsias, discussões, mudanças de
assunto e muito falatório, Gêmeos resolveu voltar ao
seu lugar.
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- A
primeira medida de Câncer foi extingüir todos os alimentos.
Isso por si só já acabaria com toda a vida existente,
mas Câncer, como sempre, nunca deixa as coisas pela
metade. Além da ameaça de morte por inanição, as mães
largavam seus filhos a esmo, mesmo os recém-nascidos.
Não havia mais famílias. Todas as pessoas decidiram
ser independentes demais, apesar de a maioria estar
despreparada para enfrentar a vida sem apoio emocional,
um lar e gente que nos quer bem por perto. Todos esqueceram
o passado, portanto nem mesmo sabiam porque estavam
fazendo tudo aquilo e porque tudo estava horrível.
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- Assim,
a pedidos imersos em lágrimas e com um pouco de chantagem
emocional, Câncer retornou ao seu lugar.
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- Leão
não se manifestou. Por causa disso, todos estavam se
perdendo na animalidade, sem contato consigo mesmos.
Ninguém queria mais saber o impacto que tinha sobre
as outras pessoas, daí que nem valia a pena viver. Suicídios.
Não havia mais nenhuma procriação, nenhum auto-respeito
e muito menos personalidades integradas. Esquizofrenia
geral, frieza nas relações. Todos os seres vivos pereciam
devido à isenção de contato e à inexistência de vontade
de se sentir vivo. Tudo estava se perdendo numa horrenda
rotina, com sistemas para tudo, sem participação do
indivíduo naquilo que deveria trazer satisfação. A incidência
de enfartes aumentou 1000% a cada dia. O Sol começava
a perder seu calor, e o sistema solar entrava na era
da escuridão e do frio eternos.
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- Para
evitar isso, Leão, exprimindo seu desejo de ser apreciado
e de demonstrar sua importância, por vontade própria,
voltou a ocupar seu lugar.
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- Virgem
não gostou muito da idéia de interromper suas atividades,
mas seguiu as ordens. Sem ele, todas as ações terminavam
em obras extremamente mal feitas, perigosíssimas para
a saúde e integridade física de todos no Universo. Ninguém
mais se importava se havia necessidade de trabalhar,
todos só queriam as coisas boas sem nenhum sacrifício.
Isso gerou sérios problemas, pois novamente não havia
comida. As pessoas ficaram doentes e não havia médicos.
As crendices sem sentido imperavam. O caos tomou conta
de tudo e nenhum ser existente conseguia mais digerir
o que restou dos alimentos, que por sinal estava muito
sujo e estragado. Nenhum conhecimento era aprofundado,
tudo era fútil e sem sentido. Não se estabelecia rotinas
nem mesmo no corpo dos seres viventes, pois a química
do organismo estava suspensa. Houve mortalidade sem
igual pela falta de higiene.
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- Terrivelmente
arrependido pelo engano, resmungando muito e se criticando
(e também ao Supremo, por fazer as coisas de um jeito
que ele não achava certo), Virgem voltou correndo a
seu lugar.
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- Libra
não sabia se entrava na greve ou se permanecia no lugar
onde estava. Com muito custo e chateado por ser desagradável,
retirou-se. Num instante tudo perdeu o brilho, as pessoas
ficaram horripilantes, os animais, tudo. Nem mesmo a
vegetação era verde, mas de uma cor desbotada, indefinível.
Guerra por todos os lados, ninguém mais tinha vontade
de unir e reunir, somente os egos eram importantes e
a vontade de cada ente tinha de prevalecer. Ninguém
tinha mais medo de nada, mas também não tinha bom senso,
que é um tipo de medo. Não se podia mais usar roupas,
porque elas feriam a pele, o chão feria os pés, o sol
queimava sem trégua e até os planetas perderam o rumo
de suas órbitas, chocando-se uns com os outros, tal
era a falta de equilíbrio. Divórcios eram tão comuns
que as pessoas nem mesmo se casavam mais - até porque
todos estavam horríveis.
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- Após
um diálogo com contrato assinado dividindo as responsabilidades
de tudo, Libra concordou em retornar.
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- Escorpião
saiu e com ele saíram todas as possibilidades de reciclagem
do Universo. As coisas apodreciam, mas não se desintegravam.
Nada morria. Cadáveres andavam pelas ruas putrefatos,
sem alma, mas com os corpos funcionando tal como máquinas
ligadas indefinidamente. As emoções mais primitivas
desapareceram também, mas com elas se foi tudo o que
a vida tem de importante. Não havia mais intensidade
de propósitos e tudo se tornou rotina pura, sem sentido.
Todos os seres agiam como autômatos e os dias, horas,
minutos, etc., tudo era o mesmo. O Universo não mais
se destruiria, devido à falta de Escorpião, mas também
não mais seria reconstruído e melhorado. Tudo passou
a ser superficial e falso, apenas cascas sem vida com
movimento. Nos seres humanos todo o processo orgânico
de excreção foi interrompido, gerando grande sofrimento.
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- Satisfeito
com a lição que dera, mas já entrando em depressão,
Escorpião voltou a seu lugar.
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- Repentinamente
as coisas diminuíram de tamanho e a desesperança tomou
conta de todos os seres. Era Sagitário entrando em greve.
As mentalidades se tornaram tacanhas, regionalistas,
sem o mínimo senso de amplitude. Nada no Universo se
expandia ou crescia mais. A humanidade definhava, emagrecia,
como que acometida por mil e uma doenças e isso acontecia
mesmo com aqueles que ainda podiam conseguir alimentos.
O ceticismo imperava a tal ponto que não se acreditava
mais nem mesmo que a pessoa ao lado respirava também.
Tudo tinha de ser comprovado cientificamente, o que
gerava muita confusão, pois não havia tempo para ter
certeza de tudo nos mínimos detalhes. Não havia mais
significado em nada, tudo era aleatório. Quanto mais
banal o conhecimento e quanto menos ele levasse a alguma
coisa melhor. Estava instaurada a era da futilidade
total, enquanto que o mundo se destruía pelo descaso
e pela falta de pessoas dedicadas a ensinar.
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- Sagitário
rapidamente voltou ao convívio daqueles que considerava
o que de melhor o Universo poderia oferecer, pois não
agüentava mais estar perdendo as novidades do high society
celestial.
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- Chegando
a vez de Capricórnio, toda a ordem cronológica das coisas
perdeu o sentido. Coisas que deveriam acontecer em seqüência,
tinham sua lógica alterada. Morria-se antes de nascer,
os jovens se tornavam velhos aos 20 anos e quem chegava
aos 50 anos estava à beira da morte ou já estava reencarnando,
não importava se houvesse problemas de saúde ou não.
Não havia mais sistema e ordem. Não bastasse isso, em
todos os outros pontos do Universo a irresponsabilidade
tomava conta. Tudo era feito de forma passional, sem
ponderação. Depois de tudo isso a destruição final seria
fazer tudo o que era sólido se tornar líquido, até mesmo
as rochas e os esqueletos.
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- Os
arquétipos precisaram intervir, "depondo"
Capricórnio de seu "status" de grevista. Só
assim ele retornou a seu lugar.
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- Aquário
em greve resultou em perda total da liberdade. Todo
o fluxo e refluxo universal cessara e todas as pessoas
passaram a pensar, agir, sentir e viver do mesmo jeito.
A preocupação maior de cada um era consigo mesmo, nada
era feito em prol da comunidade. Alguns conseguiram
viver durante um tempo em castelos feitos de ouro, mas
em volta desses castelos havia um oceano de excrementos,
lixo humano e devastação. A conseqüência foi a destruição
gradativa desses monumentos ao egoísmo pela própria
ignorância de seus donos a respeito da necessidade de
disseminar recursos para que pudessem tê-los de volta.
Todos esqueceram do ciclo da vida, da Lei do Retorno.
A palavra amizade foi banida de todos os dicionários.
Não chovia mais em lugar nenhum, pois a chuva distribui
água para todos sem exceção, portanto as nuvens desapareceram.
A humanidade quase se extinguiu, pois Aquário é o signo
da Humanidade. Até mesmo as estrelas pararam de emitir
luz, uma vez que ela banha a todos e isso faz farte
da tarefa de Aquário.
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- Cansado
da rotina de nada fazer, Aquário voltou repentinamente
ao seu lugar, pois estava bolando uma revolução para
modificar tudo o que se julgava bom até aquele momento.
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- Peixes,
retirado como de costume, simplesmente deixa de se importar
com o sofrimento humano. As crueldades infligidas são
incontáveis. Não há mais compaixão no Universo, apenas
regras rígidas. Qualquer desvio, por mínimo que seja,
é punido com severidade sem igual. A Graça Divina deixa
de descer sobre a Criação, pois preza-se sobremaneira
a execução exata das tarefas e rotinas (orgânicas, sociais
ou cósmicas), não havendo lugar para o incognoscível
ou para a possibilidade de adequar qualquer anomalia
à vida cotidiana. Por causa disso, as formas viventes
são violentamente forçadas a desenvolver-se dentro dos
padrões de perfeição absoluta. O resultado foi a extinção
da maioria dos seres , inclusive os humanos, pois nenhum
ser vivente é uma cópia fiel do protótipo do Criador,
daí que fez-se necessária a interrupção desta última
greve o quanto antes.
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- Após
o retorno lacrimejante de Peixes, que, por sinal, sentia
muita piedade e auto-piedade daquilo que só aconteceu
na imaginação, ouviu-se a pergunta do Ser Supremo: "Então?
Já decidiram quais são os signos que podem ser retirados?
Há algum que não tenha feito falta?"
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- Os
doze entreolharam-se cabisbaixos e, agora mais sábios,
responderam em uníssono: "Senhor, percebemos que
somos partes de um imenso mecanismo cósmico que jamais
sobreviveria desfalcado, mesmo de apenas um de nós.
Pedimos perdão por nossa ignorância. Decidimos, portanto,
dar como missão ao Homem a mesma tarefa que deste a
nós, fazendo com que ele, a cada geração, harmonize
nossos aspectos dentro de si mesmo. Dessa maneira, concedemos
a ele, Senhor, aquilo que recebemos de Ti: o Livre-Arbítrio
e a capacidade de superar até mesmo o que nós, como
símbolos, representamos. O Homem jamais será uma marionete
das estrelas se não quiser sê-lo."
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- Satisfeito,
o Ser deu por concluída sua obra e irradiou sua energia
divina à espera daqueles que por ela procuram.
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- Carlos
Hollanda
- São
Paulo 12/11/97
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